O serviço público de educação é um pilar essencial e imprescindível de uma democracia que, por definição, garanta a igualdade de oportunidades e o desenvolvimento integral de uma sociedade moderna.

«Como Fernando Pessoa me mudou…»


Sim, admito que nunca fui grande fã de poesia, e, portanto, não me senti minimamente entusiasmada quando me apercebi de que ia estudar Fernando Pessoa, durante grande parte do ano. Sempre olhei para a poesia como séries de palavras conjugadas “ao calhas”. Imaginava os poetas na generalidade como pessoas que como não tinham jeito para escrever e, como queriam reconhecimento e fama, limitavam-se a inventar frases com palavras e sentidos que ninguém percebe. Depois, cada estudioso que lesse esse poema inventaria um significado profundo para ele que muito provavelmente nem sequer existe. Admito também que sempre preferi ou achei que preferia as matemáticas e as coisas objectivas, o resto não era legítimo.

Começámos por dar Fernando Pessoa ortónimo, e numa primeira leitura não me surpreendi, “é apenas mais um que gosta de inventar que sabe o que está a escrever”. Continuei, persistente, a ler e a ler e, para meu espanto, reconheci nos poemas os meus sentimentos e pensamentos, aqueles que às vezes me passam pela cabeça, mas que me esqueço de voltar a pensar neles e exteriorizá-los. Talvez por ter achado que seriam tolos e sem importância. Devo confessar que foi um alívio descobrir alguém que poderia compreender, certas reflexões que me ocorrem, e (quem diria?) logo um poeta! Não admira que seja um ícone da literatura portuguesa, este senhor até diz coisas explícitas e com sentido!

Ao contrário de muita gente, não achei estranha a divisão de Fernando Pessoa em vários heterónimos. Comparei com o meu caso: na minha vida deparo-me com muitas situações diferentes, e também eu olho para elas com visões distintas, que dependem do meu humor ou de acontecimentos externos. Na minha opinião, todos nós temos de certa forma a alma fragmentada e cada fragmento vem ao exterior “à vez”.

Gostei bastante de Alberto Caeiro. A sua forma simples e pura de ver o mundo e a Natureza tal como são despertaram em mim o fragmento natural e descomplicado. Ler os seus textos é como estar presente na paisagem e saboreá-la no momento, ouvir e ver só a ler. É difícil explicar, mas é como um método imediato de transporte para um prado no Alentejo, que se torna infalível quando conjugado com a concentração e um pouco de imaginação. Ricardo Reis também mereceu sem dúvida a minha reflexão, embora não tenha sido tão fácil simpatizar com ele como com Alberto Caeiro. Passei a ter em conta a ideia de carpe diem; Ricardo Reis ensinou-me que todas a experiências são para ser aproveitadas ao máximo, pois nunca se sabe o que o Destino nos reserva. Esta máxima é tão certa para mim, como a Bíblia para um cristão. Os seres humanos possuem uma característica que os impede de gozar a vida: a banalização das coisas. Isto acontece com toda a gente, é inevitável. É como quando recebemos um presente no Natal e passado algum tempo deixamos de lhe dar valor, ou como quando tomamos algo por garantido e não damos graças por o termos. É esta característica que nos impede de dar valor ao que possuímos, que nos torna ingratos, descontentes e permanentemente à procura de algo que não temos. Ricardo Reis poderia ensinar a muitas pessoas que andam por aí desagradadas com tudo na vida a aceitarem e aproveitarem o que têm. Embora siga este lado da sua visão, há algumas ideias com as quais eu não concordo: não considero que sejamos escravos do Destino ou que a sua aceitação seja um acto triste. Sim, é possível que o Destino exista, mas isso não implica que nos conformemos com situações desagradáveis que podemos mudar. Lutar pelos nossos sonhos e acreditar que é possível alcançá-los se fizermos por isso é algo que nunca podemos esquecer.

Em jeito de conclusão, considero que o resultado do encontro com Fernando Pessoa foi, numa palavra, inesperado. Olhando para o que mudou em mim, é certo que aprendi, mas mais importante, a poesia pôs-me a pensar e a comparar o sujeito poético, comigo mesma e com as minhas ideias. Ajudou-me a auto conhecer-me, a passar algum tempo a por os pensamentos em ordem e a encarar o mundo e os contextos com outros modos.
 
Ana Miranda
(aluna CCH - Ciências e Tecnologias)

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