O texto de apresentação de «Bibliotecando em Tomar 2011 – Leituras Lusófonas», propôs um conjunto de desafios para a reflexão partilhada sobre a lusofonia:
- Poderá a dimensão linguística, vivida a várias vozes, ajudar a compreender os desafios da modernidade?
- Será o mundo lusófono capaz de desenvolver perspectivas de um futuro partilhado cimentado numa consciência cultural comum?
- Será possível estabelecer um modelo de biblioteca para o mundo lusófono?
- Que desafios esperam esta língua no plural e como podemos responder preservando a essência linguística?
Este conjunto de desafios focalizariam o debate em torno da lusofonia na língua, instrumento de produção identitária e difusão cultural; e nas bibliotecas entendidas como “
espaço[s] de entendimento, de descoberta do mundo”.
A reflexão em torno da “construção de um paradigma de biblioteca no mundo lusófono” no século XXI deveria do mesmo modo perspectivar e debater boas práticas na utilização das novas tecnologias, enquanto instrumentos de comunicação, acesso à informação, produção e partilha de conhecimento; e essenciais para que as bibliotecas do século XXI - nacionais, municipais ou escolares, itinerantes e digitais – cumpram a sua missão.Os painéis de «Bibliotecando em Tomar 2011 – Leituras Lusófonas», a selecção dos seus membros e as temáticas abordadas permitiram a reflexão em torno do papel fundamental da língua, da história e da memória na identidade cultural comum, perspectivada pela multiculturalidade.
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Pinto da França, Elsa Conde, José Possante, Fernando Sousa, Paulo Macedo e Agripina Vieira |
O início do encontro colocou os fundamentos do debate: o livro e a leitura como essenciais ao desenvolvimento humano - "Ler é expressão qualificada da cidadania" – e o papel das bibliotecas no acesso à informação e ao conhecimento.
Elsa Conde da Rede de Bibliotecas Escolares reiterou o papel fundamental das bibliotecas escolares no contacto com o livro e no desenvolvimento de competências de bem saber ler, fundamental na “sociedade da informação”; e no acesso, difusão e construção do conhecimento.
Para José Possante, Director da Escola Secundária Jacome Ratton, “a rede de bibliotecas públicas e de bibliotecas escolares têm impacto na vida das comunidades locais”.
A intervenção do Embaixador Pinto da França, «A viagem das palavras», para além de ser um extraordinário testemunho de vida e de sentido de humor, sublinhou a dispersão geográfica do mundo da lusofonia e a permanência da influência da língua portuguesa na Indonésia. Como afirmaria Rui Rasquilho, no segundo dia do Encontro, “quando os falantes viajam, a língua acompanha-os e, se for forte, fica para além deles”.
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Renato Epifânio, Paula Tavares, Sérgio Ribeiro e Luís Cardoso |
Sérgio Ribeiro (Portugal), Luís Cardoso (Timor-Leste) e Paula Tavares (Angola), de três espaços geoculturais diferenciados, apontaram uma das características fundamentais da língua portuguesa: “é a reserva dos afectos”. A linguagem e as palavras – como “cretcheu” – traduzem estados de espírito e a língua portuguesa é particularmente rica nesse sentido – “ou somos ou estamos” em oposição “to be or not to be”, conforme demonstrou Sérgio Ribeiro. Aliás, a causa timorense, alimentada pelos afectos, foi segundo Luís Cardoso “uma causa e uma vitória da Lusofonia”. Paula Tavares, incomodada por “ter de perder o cê de afecto”, afirmou que “na minha cabeça estão os gerúndios”.
Quatro continentes interligados nesta viagem por “Palavras de Mares Navegados” que situou a conexão na língua portuguesa, sintetizado nessa extraordinária frase de Luuandino Vieira: “o português, meu irmão, é difícil, mas não custa!”. Renato Epifânio (Nova Águia) constatou que “a língua portuguesa convive, na sua plasticidade e porosidade, com as outras línguas dos países da CPLP”, constatando a realidade e perspectivando assim o futuro da língua portuguesa como “cimento” da lusofonia.
O painel “Bibliotecas no Espaço Lusófono” permitiu múltiplas perspectivas sobre o papel das bibliotecas na promoção da leitura e na construção da lusofonia.
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Rui Borges da Cunha, Lurdes Gonçalves, Jorge Arrimar e Madalena Tavares |
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A viagem à herança cultural comum que constitui a Biblioteca de Macau, foi conduzida pelo seu antigo director Jorge Arrimar.
Um exemplo de boas práticas na utilização das ferramentas Web, na preservação da memória de um passado partilhado pelas diversas gentes da lusofonia, é o portal "Memória de África e Oriente", apresentado por Lurdes Gonçalves.
A extraordinária mobilização de vontades e, uma vez mais, os afectos em presença no projecto “Ilha a Ler" que ligou Alcobaça à Ilha de Moçambique, foi emotivamente apresentado por Madalena Tavares. Segundo Rui Borges da Cunha, “a criação das bibliotecas itinerantes é a política cultural mais bem sucedida de sempre em Portugal”: é eficaz ao proporcionar a muitos portugueses a única possibilidade de contacto com o livro e a leitura. Para o bibliotecário de Batalha, as apostas do presente e do futuro para as bibliotecas na sua missão junto dos leitores (actuais e potenciais) são a alfabetização informacional, a diversidade cultural e as tecnologias de vanguarda.
Em sequência, Célio Marques apresentou as tecnologias emergentes na formação a distância como determinantes no centrar do processo de ensino-aprendizagem no formando e nas suas necessidades e interesses. Acentuou que as ferramentas multi-funcionais, como o Moodle, são as ferramentas adequadas para esse propósito. Esclareceu ainda o conceito de “m-learning, aprendizagem em qualquer momento ou lugar, através da utilização de dispositivo de computação móvel”.
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Elsa Conde, Jorge Arrimar, Dina Mendes e Joel Anjos |
Um excelente exemplo de utilização dessas tecnologias foi a possibilidade de participação de Lília Santos, bibliotecária brasileira e “
Prémio Da Vinci 2010”, em vídeo-conferência a partir do Brasil e que identificou quatro factores essenciais no sucesso das bibliotecas escolares: acervo, pessoal, espaço físico e serviços. Segundo Lília Santos, através da IASL “
o mundo inteiro está pensando em bibliotecas escolares”. Um dos factores de sucesso no programa de Belo Horizonte, na sua opinião, é a existência de verba para cada biblioteca escolar.
Em Portugal, um possível exemplo do reconhecimento da importância das bibliotecas escolares materializou-se no filme realizado por Joel Anjos, aluno da Escola Secundária Jacome Ratton: "
Bibliotecas escolares: um mundo inteiro para descobrir", uma visão sobre a leitura nos seus diversos géneros e suportes.
Elsa Conde testemunhou o início do lançamento de bibliotecas escolares em Maputo (2009) e que visava minorar a carência de recursos, melhorar o ensino e defender a língua portuguesa.
Dina Mendes apresentou o Projecto Ler+ em Timor-Leste, com o duplo objectivo de lançar uma Rede de Bibliotecas Escolares naquele país, bem como defender o português e o tetum das tentativas hegemónicas do inglês.
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José Carlos Vasconcelos, Carlos Matos Gomes e Moura Calheiros |
O primeiro painel do segundo dia - “A ficção e a memória portuguesa contemporâneas em territórios da lusofonia” - centrou-se na questão da guerra colonial e nos seus reflexos na produção literária da primeira geração a escrever em liberdade, após a Revolução dos Cravos.
Moura Calheiros abordou o seu livro “Última Missão”, um regresso à guerra colonial e ao local do passado, em prol da sua definitiva resolução.
Carlos Matos Gomes reflectiu em torno das quatro fases de abordagem da guerra colonial – “a literatura dos alferes” e a denúncia, a “literatura a partir dos anos 80”, a “literatura do furriel-miliciano (memorialista)” e a “literatura do coronel (enquadrada factualmente)”.
A reflexão de Lídia Jorge em torno de África – “o epicentro da memória e da identidade nacional, tal como a guerra civil para Espanha ou a 2ª guerra mundial para a Alemanha” proporcionou uma abordagem da produção literária enquanto mecanismo de preservação da memória e de reforço da identidade.
As “
Viagens lusófonas” do Embaixador Pinto da França a Ambone, o trabalho em prol da preservação da língua portuguesa de Ana Paula Laborinho - ex-Presidente do Instituto Português do Oriente e actual do Instituto Camões; e a importância da aviação e do legado científico e técnico de Gago Coutinho, sublinhado por João Roque, comprovaram as palavras de Rui Rasquilho: “
a saga da língua é a saga do português e do outro que dela se apropriou”.
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António Varela, Graça Barão, Fernando Pinto Amaral e Regina Rocha |
No painel da tarde “Novo acordo ortográfico, desafios e respostas”, Regina Rocha (professora), António Varela (jornalista) e Fernando Pinto Amaral (Comissário do Plano Nacional de Leitura) discutiram se a uniformização ortográfica tem base política e cultural ou linguística. Seja pelas motivações ou pela natureza das alterações aprovadas, o painel reconheceu que “o novo acordo ortográfico pôs mais gente a discutir as questões linguísticas”. António Varela adoptou o acordo em 2009 – “o jornalismo lida com a novidade” – e, para si, a aceleração da escrita trará novos desafios. Muito interessante a opinião de Fernando Pinto do Amaral no final do painel e do Encontro: “Como professor terei de respeitar, como escritor não gosto.”
Não deixou de partilhar este sinal subtil da dinâmica da língua:
Sophia preferia dansa com “s” e não com “ç”
Hiperligação:
José Fernando Vasco