O serviço público de educação é um pilar essencial e imprescindível de uma democracia que, por definição, garanta a igualdade de oportunidades e o desenvolvimento integral de uma sociedade moderna.

«Memórias de Abril...»

(...) O artista tem a condenação e o dom de nunca poder automatizar a mão, o gosto, os olhos, a enxada. Quando deixa de descobrir, de sofrer a dúvida, de caminhar na incerteza e no desespero – está perdido. 
(Miguel Torga)


Para que nestes tempos António de Oliveira Salazar, principal «arquitecto» do Estado Novo, não seja um ausente, é bom que nos lembremos que desprezou a democracia liberal, o pluralismo político, enfim, a liberdade. Na «encenação» do Estado Novo escolheu ser uma personagem sóbria, ao contrário dos «grandes actores» em voga no seu tempo, um pouco «loucos», mas também por isso mais próximos das personagens dos sonhos. Certamente que não atingiu a dimensão «mística» de tais homens ou de tais personagens. Na sua peça preferiu cumprir os imperativos «a minha política é o trabalho»; «a Pátria não se discute»; «para Angola e em força» e claro «orgulhosamente sós».


De facto, este homem preenchia todos os requisitos que os outros desejavam para se identificarem, subira a pulso, não era dado a grandes paixões, mantinha uma postura mordaz de quem conseguiu tudo num braço de ferro com as origens humildes, não discursava por tudo e por nada. Personagem não de um teatro de palco mas de bastidores, restringia o sentimento à pátria, à família e à religião. «Os grandes homens, os grandes chefes, não se embaraçam com preconceitos, com fórmulas, com preocupações de moral política», explica António Ferro, Director do Secretariado de Propaganda Nacional, um dos mais importantes mentores da política do espírito da «peça» Estado Novo…

A rigidez e a sobriedade eram simultaneamente assustadoras e fascinantes que ao invés do que se lhe poderia vaticinar, nunca o impediu de controlar o destino de uma sociedade mais ou menos alheada. Não se pode afirmar que tivesse tido uma evolução política brilhante, pois certamente o complexo contexto económico, financeiro, social e político vivido durante a 1ª República e prolongado no período da «ditadura militar» favoreceu em muito a sua ascensão. Mas pelo menos apresentou um «guião» com um pensamento moral e político coerentes. A maioria dos espectadores da sua encenação não eram provavelmente nem os mais esclarecidos nem os mais convictos nos seus princípios, eram apenas pessoas habituadas a serem submissas face aos ditadores, sedentas por que lhes dessem ordens, para saberem o que fazer da vida, das suas vidas. Quanto aos seus companheiros de palco revelaram um perfeito conhecimento dos seus papéis, sabiam de cor todas as suas falas, todas as suas expressões e todas as movimentações em cena, nunca colocando em causa o protagonismo do actor principal. Cumpriram integralmente de uma forma mais ou menos convicta o «seguidismo hipócrita» bem entranhado na forma do Ser português. Também de uma forma um pouco diferente comparativamente com os «grandes» ditadores do século XX foi o seu nome, não a sua imagem, que se tornou objecto de culto. Talvez por isso tivéssemos alguma dificuldade em retratá-lo no guião da nossa peça…

O espaço de toda esta encenação era o deste «país das mil maravilhas», deste país «dicotómico», do homem duro e dos que choram, do asceta e dos sentimentais, dum homem que raramente tinha dúvidas e dos que quase sempre se enganavam e que queriam ser protegidos pelo grande «pai», ainda que este aplicasse duros castigos e piores penas a quem ousasse ser rebelde e ter pensamento próprio. Eram poucos aqueles que questionavam o abuso de autoridade porque no fundo eram muitos os que sonhavam ter idêntico poder, infligir sevícias não muito diferentes. E esse era e talvez seja ainda o veneno deste país encantado, até que chegou o dia do «acto final»… O dia que foi descrito pela brilhante Sophia de Mello Breyner nos memoráveis versos: «Esta é a madrugada que eu esperava / O dia inicial inteiro e limpo / Onde emergimos da noite e do silêncio / E livres habitamos a substância do tempo.»



Para que possamos continuar a habitar nesse «mundo» idealizado por Sophia é fundamental reviver com as novas gerações os tempos de Abril utilizando para tal instrumentos como a música, a poesia, o cinema, o teatro… De um certo modo foi nesta linha de pensamento que no passado dia 29 de Abril de 2011, as alunas Ana Vieira (10º B); Cláudia Pessoa (10º E); Daniela Gonçalves (10º E); Inês Trabucho (10ºB); Marta Santos (10º F); Natacha Sousa (10º E); Raquel Miranda (10º E) e Telmo Matos (10º E) que integram o Clube de Teatro apresentaram no âmbito das actividades comemorativas do 25 de Abril realizadas na nossa Escola um conjunto de «sketchs» intitulados «Memórias de Abril». Assistiram às apresentações no Auditório da Escola a Directora e Sub-Directora, o professor-bibliotecário, elementos das associações «O Farol» e «F-4», o Vogal da Junta de Freguesia de Cacilhas, alunos e familiares, o Coronel Santa Clara Gomes da Associação 25 de de Abril, professores assim como formadores e formandos das Turmas EFA. Importa sublinhar igualmente que esta peça foi apresentada, no dia 17 de Março, nas actividades da Futurália. Foram momentos únicos e inesquecíveis. Foi fantástico o empenho dos alunos envolvidos.


Depois de algumas reflexões relativamente à importância das actividades comemorativas do 25 de Abril, apetece-me relembrar a questão «Pai, diga-me lá então para que serve a história», com a qual Marc Bloch abre a obra «Introdução à História». Parece-me que a mais significativa utilidade prática que pode ter a História como conhecimento científico é permitir estudar o passado para que possamos compreender melhor o presente e ajudar-nos a melhorar o futuro. É neste sentido, e não numa linha de pensamento puramente ideológica que importa relembrar e se possível reviver as memórias de Abril… Afinal, como escreveu Joseph Joubert «A memória é o espelho em que vemos os ausentes.». Ou então como diz a música «As brumas do futuro», interpretada pela Teresa Salgueiro: «a razão de um povo inteiro / leva tempo a construir».

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Clube de Teatro
(texto)
Modesto Viegas
(fotos)
José Fernando Vasco
(hiperligações)

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